Prof. Marcio Carneiro

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quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Três Pilares no Conceito Secular de "Cultura"

Três Pilares no Conceito Secular de "Cultura"

A origem da nossa palavra “cultura” encontra-se na língua latina. O radical da palavra é o riquíssimo verbo latino colo, que tem o sentido original de “cultivar”. O vocábulo latino cultus (particípio de colo) tem, portanto, inicialmente o sentido de cultura da terra. O verbo assumiu o sentido de “cuidar de”, “tratar de”, “querer bem”, “ocupar-se de”, “adornar”, “enfeitar”. Depois o sentido de “civilização”, “educação”; e também o sentido de “adorno”, “moda”, “decoração”. Mais recentemente, os alemães tomaram a palavra “cultura” num sentido mais amplo, para referir-se ao cultivo de hábitos, interesses, língua e vida artística de uma nação. Atualmente, na língua portuguesa, talvez não exista nenhuma outra palavra com sentido mais abrangente do que a palavra “cultura”. Por cultura se entende muita coisa.
“Cultura” é o campo de estudo da antropologia. Diz respeito à humanidade como um todo e ao mesmo tempo a cada um dos povos, nações, sociedades e grupos humanos. Não pode existir uma sociedade sem cultura. Utilizamos aqui, portanto, uma concepção ampla de cultura, que diz respeito a tudo o que caracteriza uma realidade social, a existência social de um povo ou nação, ou então de grupos no interior de uma sociedade. As conclusões do Congresso de Lausanne sugerem o seguinte conceito: “cultura é um conjunto integrado de crenças, de valores, de costumes, e de instituições que expressam estas crenças, valores e costumes, que unem a sociedade e lhe proporcionam um sentido de identidade, de dignidade, de segurança e de continuidade.”

O conceito moderno e secular de cultura sustenta-se sobre três pilares:

1) A IDÉIA DE TOTALIDADE - No conceito de cultura, a idéia de totalidade está presente, pois cultura diz sempre respeito a processos globais dentro da sociedade. A cultura implica uma certa medida dehomogeneidade. Michael Horton, em seu livro “O Cristão e a Cultura; nem separatismo nem mundanismo”, salienta esta característica globalizadora no conceito, quando diz: “Embora em cada cultura existam muitas subculturas, existem tendências que marcam um povo”.
O antropólogo brasileiro, Roberto da Matta, diz que não “há cultura se não houver uma tradição viva, conscientemente elaborada que passe de geração para geração, que permita individualizar ou tornar singular e única uma dada comunidade relativamente às outras (constituídas de pessoas da mesma espécie). É a tradição que dá à coletividade a consciência do seu estilo de vida." A cultura une várias gerações durante uma época. O processo mediante o qual as pessoas aprendem o modo de vida da sua sociedade é denominado de enculturação. A cultura é dinâmica e sofre mudanças. A cultura nunca é estática. Quando a mudança é mais rápida do que a capacidade da comunidade adaptar-se a ela, podemos falar corretamente de um “choque cultural.
A cultura implica, assim, uma certa medida de homogeneidade. Não obstante, dentro de uma cultura também podem haver subculturas, em que a unidade maior pode ser uma comunidade, um clã, ou uma tribo pequena, etc. Se as variações ultrapassam determinado limite, surge uma contracultura, e este processo pode se tornar muito destrutivo. O termo “contracultura” foi cunhado pela imprensa norte-americana, nos anos 60. A palavra dizia respeito ao espírito libertário e questionador da racionalidade ocidental. Uma das características básicas do conceito é o fato de se opor, de diferentes maneiras, à cultura vigente e oficializada pelas principais instituições das sociedades do Ocidente. Uma postura, ou até uma posição, de crítica radical em face da cultura convencional.
Homens e mulheres precisam de uma existência unificada. Sua participação em uma cultura é um dos fatores que lhes proporciona o sentido de pertencer a algo. A cultura dá um sentido de segurança, de identidade, de dignidade, de ser parte de um todo maior e de partilhar a vida de gerações anteriores e também das expectativas da sociedade com respeito a seu próprio futuro.

2) A IDÉIA DE NATURALIDADE – A antropologia secular corretamente afirma que cultura é uma realidade humana. Cultura é algo humano, no sentido em que se relaciona com o homem, em sua individualidade e em seus relacionamentos sociais, e com o meio em que vive. Entretanto, a antropologia secular afirma o caráterestritamente natural da cultura. Isto é: o homem é a origem e o objeto exclusivos da cultura. O antropólogo e o sociólogo seculares abordam o estudo da cultura supondo que o mundo é um sistema fechado, e que todos os fatores da formação cultural, inclusive o religioso, estão contidos dentro do sistema e determinados por ele, de modo que as próprias alegações do conhecimento de âmbitos sobrenaturais ou supraculturais são, elas mesmas, o produto do sistema.
Em contraponto, alguns antropólogos cristãos fazem uma consideração acertada da importância do âmbito “supracultural” da realidade na sua interação com os fatores culturais humanos. Por “supracultura” eles se referem aos “fenômenos da crença e do comportamento cultural que têm sua origem fora da cultura humana”. O Pacto de Lausanne asseverou: “Uma vez que o homem é criatura de Deus, parte de sua cultura é rica em beleza e bondade. Pelo fato do homem ter caído, toda a sua cultura (usos e costumes) está manchada pelo pecado e parte dela é de inspiração demoníaca”.
Concluímos que a realidade do âmbito de Deus e de Seu reino, e de Satanás e do império dele, é algo que precisamos considerar em nosso estudo da cultura. A primeira origem supracultural dos fenômenos na cultura é a divina, e a segunda origem supracultural é a demoníaca. A Escritura clama por arrependimento e reforma, e a história registra numerosos casos de mudança cultural para melhor. Como seres humanos caídos, nenhuma das nossas culturas é perfeita em verdade, beleza e bondade. No âmago de toda cultura (quer seja esse cerne uma visão “religiosa” ou “secular”) há um elemento de egocentrismo, de auto-adoração do homem.
Portanto, a realidade da interação entre o conteúdo supracultural e a forma cultural é da máxima importância em qualquer abordagem adequada nas relações entre a Igreja e a Cultura. A cultura nunca é neutra. Cada cultura reflete este conflito. A religião nunca é meramente uma questão humana, mas, sim, um encontro dentro do âmbito supracultural do reino de Deus e do império de Satanás. No centro da cultura há uma cosmovisão, ou seja, uma compreensão geral do caráter do universo e do lugar que se ocupa neste universo. Esta compreensão pode ser “religiosa”, ou pode expressar um conceito “secular” da realidade, como a proposta de sociedade do marxismo materialista.

3) A IDÉIA DE NEUTRALIDADE – A antropologia secular resiste ao conceito de que os valores culturaispossuem mérito e qualidade. Aqui está outro grande problema para o cristão diante da antropologia contemporânea. Um dos problemas que confrontamos é que a visão da sociedade secular tende a considerar a cultura, em suas variadas formas de expressão, como moralmente neutra. Não existe o “certo” ou o “errado”, quando se trata de cultura. É tudo apenas uma questão de usos e costumes. Assim, isto se conecta com a idéia de relatividade. Qualquer tentativa de correção de aspectos culturais é considerada como um impróprio juízo de valor, e rotulada de etnocentrismo cultural, ou violência cultural. “Todas as religiões têm que abandonar a sua arrogância teológica. Nenhum grupo religioso pode jactar-se de ser superior ao outro em termos de verdade, porque a religião está associada à cultura. E não existe uma cultura superior à outra. Todas são igualmente boas. Todas as tradições religiosas culturais têm os seus valores salvíficos”. Um jornalista escreveu recentemente que o povo brasileiro tem sido “ensinado nas escolas a considerar que o canibalismo, os sacrifícios humanos ou rituais para tornar os inimigos sexualmente impotentes são expressões religiosas tão respeitáveis quanto a fidelidade judaica e a piedade cristã”. Portanto, não há mais necessidade de conversões! Essa pressuposição também esvazia o conceito de missões religiosas em terras estrangeiras ou transculturais.
Há, portanto, uma tendência de conceituar cultura de uma forma tal que todas as formas comportamentaissão aceitas como válidas e até mesmo valiosas. Essa mesma tendência se estende a outras áreas de realizações humanas, como por exemplo, às artes plásticas e à música. Boa parte do que é chamado de “música”, em vez de produzir prazer estético, produz apenas repugnância e perplexidade ante a decadência. Boa parte do que é chamado “arte”, em vez de cultivar o belo, exalta o horrendo. Somos ensinados, por algumas pessoas, que tudo que provêm espontaneamente de um povo deve ser aceito e até trazido para a igreja. É tudo uma questão de estilo, nos dizem.
Daí colocar-se um desafio para os cristãos, visto que estes reconhecem a Palavra de Deus como o padrão aferidor da cultura. E não seria isto que deveríamos concluir da oração de Jesus Cristo, quando diz que a Palavra do Pai é a Verdade?
Alguém que leu este texto comentou que ele também "levanta a questão da contextualização, que não pode ser evitada pela igreja evangélica à cada geração". E acrescentou: "Pessoalmente, acho que cada cultura mantém traços da Queda, que se revelam em práticas e costumes e ritos e jeitos de ser. O Evangelho pode se aproveitar da cultura desde que a expurgue destes traços remanescentes da vida de Adão. Esse é o desafio". Um comentário muito acertado, parece-me.

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